Era uma praia, não uma praia
qualquer, pois era aquela que eles tinham naquele dia. Tinha um gosto especial.
Já se davam meses que aquele casal quiçá tinha se oportunizado férias. Era aquilo
também um fugir de tudo o que lhes representou de decepções e medos daquele ano
tão penoso.
Curtiam as primeiras trocas de
intimidade e carinhos longe de tudo. Conheceram-se no caos de uma metrópole há
ainda muito pouco. Amores para cá, amores para lá. Sabiam, após muitas das
andanças em seus próprios caminhos, que o amor era raro, mas não estático.
Sentiam que ali não havia obrigações, pois todos com seus corações sabem da
capacidade de aprender e reaprender a amar seja quando for – quando semeado
pelo tempo.
No entanto, o nosso personagem,
tão homem, tão contemporâneo, bradava em ondas revoltas. Era ele escravo de seu
senhor, de seu corpo, de seus medos. Lembrava mares outros que, como em grandes
tempestades, já se pusera. Ainda ali persistiam os erros, os acertos, a gana e
os apegos. O mar ainda se jogava com força nas encostas de seu ser. As ondas insistiam
em transformá-lo em areia fina e disforme.
Ela, tão mulher, tão dona de si, já
se punha desnuda de suas vestes de outros invernos. Estava já adaptada ao clima
dos trópicos, à simplicidade daquela vida pacata ali a sua volta. Dizia que um
banho no mar brando e morno seria uma boa. Seria um símbolo de renovação da
alma, de finalizar um ciclo e o recomeçar de outro.
Mas ele insistia em trazer sua
tormenta. Não lhe era aprazível o recostar-se na rede sentindo o vento
bater-lhe as bochechas. Afinal inquietava-se pensando de onde vinham aquelas
águas do rio e para onde elas iriam. Não se permitia fazer parte daquele rio,
que se faz parte do mar, que se faz parte do todo...
Mas Mariana intuindo toda sua
energia, pegou nos cabelos de Ricardo e o beijou intensamente e inesperadamente.
Por um momento único as suas almas encontraram-se e Ricardo percebeu toda a vida
e seu sentido. Era aquilo uma fração do amor em sua forma pura e única. Era
aquele momento único em sua existência, impossível não contemplá-lo. Era o primeiro
segundo que conseguira desfrutar de seu maior presente: o seu, o deles, o
presente.
Fora o amor em forma de paixão
que trouxera Ricardo de volta à vida. Agora já não restava outro desejo senão o
de olhar aquele mar e sentir o aroma do sal morno. Ensurdecia-se com o barulho
de ondas que fechavam suas pestanas a ouvir a força da natureza em seu peito.
Não mais seus fantasmas, não mais suas dores e alegrias passadas. Vivia agora
aquele momento e tão somente aquilo.
Ricardo então olhou nos olhos de
Mariana, pegou sua mão e a recostou por sobre o seu peito. Com os olhos
marejados de lágrimas, ouviu a sua alma e falou baixinho: “obrigado”.
Mariana, intuitiva como era, já
presumia do que se tratava, pois a feição de Ricardo já era outra agora. Não lhe
disse mais nada. Ficaram ali, abraçados por mais algumas horas, presenteando-se
com o entardecer do sol que ia se forjando do nácar ao alaranjado e por fim se
derramava no mais vivo vermelho por sobre o mar. Fora ali, no cair do dia, que
se dera um novo respirar da alma.
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