Quem já não quis mudar-se para uma ilha, longe de tudo e
todos os que incitam ao caos. Bem verdade que cada um sonha com a sua ilha, a sua
própria, do seu jeito. Cada um tem um paraíso guardado dentro de si. Quem dera
eu então, viver em uma ilha, que não seria necessariamente cercada de mar, mas por
campos dourados, laminados por ventos vindos do Sul.
O ranger do relógio traria o dia, uma vez, e a noite outra.
Seria assim o tempo contado, mas também fracionado, pelas vezes do leite ordenhado
dos ventres das vacas em seus cercados. Da varanda larga colocar-me-ia numa rede num fim
de tarde para rir da meninada a caçar ovos por entre poleiros, espantando com
medo, as galinhas chocadeiras.
Lá, o dia-a-dia jamais cansaria. A música suave de estradas
passadas caminharia por entre os corredores, chamando todos à sala, frente à
lareira, para ali ficar no calor do fogo, ouvindo os estalos da lenha.
Esta ilha de modo algum receberia sinal de mundo outro. Lá o
único jornal, seria o da vizinha, que daria bom dia com notícias do povoado de
lá. Assassinatos, quadrilhas e corrupção não passariam mais na televisão.
Cortaríamos assim a escola de um ladrão.
A tranquilidade se daria por gestos simplórios. Mostraria a
paz por entre aqueles, que já tiraram do tempo, demais amarguras, para se
importar com as frescuras, dos dias a mais.
E para quem ali quisesse viver, teria de aprender a ouvir os
canarinhos com atenção, pois assim, dum continente de poucos ouvidos, conseguiria
se abrir mão. Nesta doce epifania, se poderia a paz sentir. Seria ali num
repousar das costas no gramado, que se escutaria, com o sol recobrindo a face, o
que a vida realmente tem a dizer. Aprenderíamos assim um novo fazer do pão, de
nosso próprio trigo plantado, sem mais prestar atenção, às receitas criadas no
caos do mundo de lá.
Ilha assim, levo em meu coração. Coloco lá quem eu quero,
coleciono as pessoas que amo, envoltas nos sentimentos mais nobres que já fui
capaz de sentir. E por vezes, permito-me para lá fugir...
Fernando Wolf